quinta-feira, 9 de setembro de 2010

SAUDADE

Depois das férias, uma pessoa minha amiga, mandou-me para reflexão, este maravilhoso poema de Fernando Pessoa sobre a separação e a saudade que ela provoca em cada um de nós. Perante tal dureza, mas tão real, o que eu possa dizer não significa nada. No entanto, as palavras do poeta são, além de verdadeiras, acutilantes e desafiadoras. É com este espírito que aqui reproduzo o poema.


"Um dia a maioria de nós irá separar-se.
Sentiremos saudades de todas as conversas atiradas fora,
das descobertas que fizemos, dos sonhos que tivemos,
dos tantos risos e momentos que partilhámos.

Saudades até dos momentos de lágrimas, da angústia, das
vésperas dos fins-de-semana, dos finais de ano, enfim...
do companheirismo vivido.

Sempre pensei que as amizades continuassem para sempre.

Hoje já não tenho tanta certeza disso.
Em breve cada um vai para seu lado, seja
pelo destino ou por algum
desentendimento, segue a sua vida.

Talvez continuemos a encontrar-nos, quem sabe... nas cartas
que trocaremos.
Podemos falar ao telefone e dizer algumas tolices...
Aí, os dias vão passar, meses... anos... até este contacto
se tornar cada vez mais raro.

Vamo-nos perder no tempo...

Um dia os nossos filhos verão as nossas fotografias e
perguntarão:
Quem são aquelas pessoas?

Diremos... que eram nossos amigos e... isso vai doer tanto!

- Foram meus amigos, foi com eles que vivi tantos bons
anos da minha vida!

A saudade vai apertar bem dentro do peito.
Vai dar vontade de ligar, ouvir aquelas vozes novamente...

Quando o nosso grupo estiver incompleto...
reunir-nos-emos para um último adeus a um amigo.

E, entre lágrimas, abraçar-nos-emos.
Então, faremos promessas de nos encontrarmos mais vezes
daquele dia em diante.

Por fim, cada um vai para o seu lado para continuar a viver a
sua vida isolada do passado.

E perder-nos-emos no tempo...

Por isso, fica aqui um pedido deste humilde amigo: não
deixes que a vida
passe em branco, e que pequenas adversidades sejam a causa de
grandes tempestades...

Eu poderia suportar, embora não sem dor, que tivessem
morrido todos os meus amores, mas enlouqueceria se morressem
todos os meus amigos!"

Fernando Pessoa

quinta-feira, 2 de setembro de 2010

O TEMPO E A CONTA

Com o decorrer do tempo vamos ficando cada vez mais conscientes da precariedade da vida e da importância que cada fracção de tempo tem para aquilo que fazemos ou deixamos de fazer.
A este propósito encontrei um poema de Frei Castello Branco (Séc.XVIII), chamado, o Tempo e a Conta, e que pela sua beleza aqui reproduzo, esperando que alguns leitores se sintam interpelados por ele.

"Deus nos pede do tempo estreita conta
E é forçoso dar conta, a Deus, do tempo!
Mas como dar do tempo tanta conta,
Se se perde, sem conta, tanto tempo?

Para fazer a tempo a minha conta,
Dado me foi, por conta, muito tempo.
Mas não cuidei no tempo, e foi-se a conta,
E eis-me agora sem conta... eis-me sem tempo...

Ó vós, que tendes tempo sem ter conta,
Não o gasteis, sem conta, em passatempo;
Cuidai, enquanto é tempo, em terdes conta.

Ah! Se quem isto conta, do seu tempo
Tivesse feito a tempo, apreço e conta,
Não chorara, sem conta, o não ter tempo!"