sexta-feira, 19 de dezembro de 2008

Natal - O rosto do nosso Deus

Todos nós mais crentes ou menos crentes ou até descrentes, já nos perguntámos muitas vezes como será Deus. No entanto, a imagem que d'Ele fazemos tem muito mais a ver com a nossa recriação do que propriamente com aquilo que Ele é verdadeiramente.
Uma vez mais o Pe. Correia de Oliveira traz-nos a sua visão, verdadeiramente humana e ao mesmo tempo divina e nas quais eu creio, uma vez que este é o sentido pleno da divindade incarnada.

Aníbal Carvalho

Natal - O rosto humano do nosso Deus

1. Deus é amor e humor

a. Deus é amor
No Natal revela-nos o rosto, a identidade do nosso Deus: aparece-nos como criança que não mete medo a ninguém, que não tem vergonha de permanecer na nossa terra, que, afinal, nunca abandonou o paraíso que criara, que continua permanentemente à nossa procura, como o fizera com Adão, que jamais falta ao encontro e ao diálogo, que quer e está mais presente em nós do que em qualquer sacrário do mundo, porque nós somos os seus únicos interlocutores, os que estamos à sua altura, feitos à sua imagem e semelhança, capazes de amar e nos deixarmos seduzir, construtores e consumidores de felicidade.
É consolador saber que Deus não tem pejo da minha carne, da minha miséria, do meu pecado. E saber que me abençoa diariamente, só sabe olhar para o meu lado bom, perde a cabeça comigo, não deixa escapar uma ocasião para fazer declarações de amor, organiza festas em minha honra, renova permanentemente o meu estatuto de filho, continua a apostar e a dar a vida por mim. É nele que vivo e encontro o meu ponto de referência; é ele que me faz sentir habitado, amado e válido.

b. Deus é humor
Esperávamos um Deus omnipotente, rico e importante, e Deus nasce, indefeso, numa aldeia perdida do globo, fora da sua terra e da sua casa, adorado por marginais (pastores) e estrangeiros (magos) e ignorado pelos seus. Deus ri-se dos nossos ares de prestígio e grandeza, porque se sente o último e está ao serviço de todos (onde ele fica mesmo bem na fotografia é no presépio, no lava-pés, na cruz e fora do sepulcro). O que o caracteriza não são os atributos e os privilégios, mas a ternura, o amor e a compaixão. Bem tentamos inventar um Deus que seja a compensação das nossas fragilidades: somos pobres, imaginamos um Deus rico; somos fracos, criamos um Deus forte e poderoso; sofremos, idealizamos um Deus impassível e olímpico; precisamos dos demais, construímos um Deus autónomo e independente. E Deus ri-se, porque para nos parecermos com ele e sermos divinos de verdade, só precisamos de amar um pouco mais, de servir o outro e os outros um pouco melhor, de não levarmos tão a sério os nossos defeitos e o nosso pecado, de sermos mais simpáticos e atenciosos, de perdoarmos e acreditarmos mais uns nos outros. Ou seja: necessitamos de ser mais nós próprios, mais humanos, mais atraentes, mais sedutores, mais benignos, mais distribuidores de bênçãos e de ternura.


2. Deus é nosso conterrâneo e contemporâneo

A boa notícia transmitida pelos anjos aos pastores foi esta: “Nasceu-vos hoje em Belém, em vossa casa, um Salvador!”. Não me amou à distância e por correspondência. Preferiu o contágio e a comunicação directa.
Fê-lo há dois mil anos, mas, se extrair uma certidão autenticada do seu nascimento, verifico que o presépio está instalado dentro de mim, que ele tem residência habitual na minha casa, que vive a meu lado e é meu condómino, meu compatriota e concidadão, meu conterrâneo e contemporâneo. Ele é o meu território e a minha Pátria, como dizia Santo Agostinho. É de hoje e de sempre: o meu Senhor e o meu Deus, como proclamava Tomé, após a ressurreição. Ele é o portador e o transmissor de espírito, o vencedor da morte, o vivente, o que nos ameaça continuamente de Vida.
Quando uma personagem admirável se apaixona por outra aparentemente insignificante, somos levados a perguntar: “Que terá visto nessa pessoa?” Algo, que nos escapa, terá enxergado e vislumbrado nela. No Natal, irrompe a pergunta: “Que terá visto Deus nesta pobre humanidade, para se apaixonar e dar a vida por ela? “Que é o ser humano, interpela um salmo, para que Vós, Senhor, vos lembreis dele?”. Dizia Martín Descalzo: Afinal, todos nós nascemos em Belém, porque em Belém nasceu o melhor de nós próprios.
Auguramo-nos, no período natalício e na passagem do ano, boas festas, alegria e felicidades. Mas como, no caso de Jesus, é necessário descobrir que a solidão de Belém se atenua com a visita dos Magos, que a fuga para o Egipto se completa com o regresso à residência de Nazaré, que a pretensa perda em Jerusalém desagua no encontro familiar e cálido com Maria e José. Ou seja, as nossas entradas no novo ano não devem descurar todo o calendário posterior, pois as intempéries do inverno só se dulcificam com a suavidade da primavera, os dias feriais só assumem sentido se saborearmos os festivos. A mirra da nossa fragilidade e do nosso cansaço precisa de combinar com o odor do incenso da nossa simpatia e com a preciosidade do ouro de toda a nossa riqueza interior.
Pe. Correia de Oliveira

NATAL, oportunidade para fazer uma reforma administrativa

Contrariamente àquilo que o comércio e a mundanidade de hoje nos sugere, o verdadeiro Natal que em cada ano vem até nós, propõe-nos um tempo propício para olharmos para dentro da nossa "casa" e para a nossa "vizinhança", de forma a podermos fazer uma boa avalição do nosso "deserto" interior e abrarçarmos conscientemente valores mais autênticos e duradoiros.
Para nos ajudar a fazer essa caminhada, deixo aqui um texto muito significativo do Pe. Correia de Oliveira, o qual nos interpela e desafia, para que sem medos, a aceitemos tal como Aquele que nasceu, nos deu como exemplo.
Aníbal Carvalho

Natal, oportunidade para fazer uma reforma administrativa


Já que Deus, pelo Natal, parece ter desarrumado tudo e feito um investimento numa zona erma e desertificada (João Baptista prega no deserto e o povo vai atrás dele), bom seria, também nós, procedermos a algumas alterações significativas:

1. Mude a capital do seu país
- Esteja atento e aposte mais nos seus arrabaldes, que são, afinal, a sua face oculta, o seu lado mais humano, o seu interior e o que tem de melhor. Houve reis de Portugal que deixaram a cidade de Lisboa e viveram temporariamente em Coimbra, Leiria, Viseu e Évora. E Jesus não nasceu na cidade de Jerusalém nem em Belém, mas na periferia, nos arredores.
- Povoe mais o seu terreno maninho e, em vez de extirpar defeitos, potencie as qualidades. Se continuar a guiar-se apenas por si, corre o risco de se extraviar, como aconteceu com os Magos em Jerusalém, que era a capital do conhecimento, mas também dos indecisos (veja-se o caso de Herodes e dos doutores da lei).

2. Aproveite o material reciclado
- O Natal é o tempo da terceira idade: Zacarias, Isabel, Simeão e Ana. São miraculados, que se entretêm a distribuir bênçãos. Todos revalidam os prazos: Simeão estica a vida, para poder ver a Luz das nações – o Menino Deus; Ana, aos 84 anos, dedica-se a cantar os louvores de Deus e com voz calibrada e afinada. Nunca se é idoso, quando se está à espera de alguém, quando se vive para os outros, quando se estende os braços e os olhos para Deus. Não obstante parecermos estéreis (é o caso de Isabel), o Espírito Santo já nos fecundou há imenso tempo e levamos mais de seis meses de gestação na santidade. Temos de apoiar o processo revolucionário em curso, que Deus iniciou em nós.
- Deus utiliza aparentemente material antigo ou ainda não testado (como é o caso de Nossa Senhora), jogadores que não estavam sequer convocados para estágio nem tinham lugar no banco dos suplentes, e com eles faz maravilhas.

3. Cresça e desapareça
Jesus crescia em estatura, sabedoria e graça, porque obedecia a seus pais na casa de Nazaré.
- A Igreja cresce, quando é discreta e não se anuncia a si mesma; quando não aposta no número dos fiéis, na força das estatísticas, na concorrência ou no seu prestígio, mas se pauta pela fidelidade a Jesus Cristo; quando se sente pequena e pecadora, é que descobre que a sua força vem de alguém que está no meio dela.
- O cristão só merece esse título, quando se converte e verifica que o importante não é empenhar-se muito na corrida, mas correr na direcção certa; não tem de fazer mais, mas de comportar-se de forma diferente; não deve tratar a salvação como um assunto pessoal mas como uma opção comunitária. Deus faz-nos crescer por contágio e toque pessoal: ser santo é colocar-se totalmente nas suas mãos e parecer-se cada vez mais com Ele.

Pe. Correia de Oliveira

quinta-feira, 18 de dezembro de 2008

NATAL

Natal significa nascimento. Para nós cristãos, significa celebrar a festa do nascimento de Cristo, que aconteceu há pouco mais de 2000 anos.
Com a comercialização da época, muitos já não sabem do que se trata. Sabem que se oferecem prendas uns aos outros, mas não sabem sequer, a razão por que o fazem. É a paganização do Natal. Ora isso torna estes momentos, muitas vezes dramáticos e dolorosos, para quem faz estas coisas sem qualquer sentido.
É preciso e urgente reencontrar o verdadeiro sentido do Natal.
Para que o essencial não se perca, trago aqui um texto lindíssimo, escrito pelo Pe. Correia de Oliveira, que com a sua devida autorização aqui reproduzo.
Pode ser que com esta visão nos consciencializemos, todos, de que andamos muito enganados, quando só olhamos para as luzes e para as prendas, e esquecemos Aquele que nasceu e que agora estamos a homenagear.
Aníbal Carvalho

AS SURPRESAS DO MENINO DEUS


É Natal, não quando me limito a comemorar a vinda do Filho de Deus a este mundo, mas quando tomo consciência de que Deus nunca saiu da nossa terra e encontra a sua alegria e o seu céu em morar no coração de cada homem.

É Natal, não quando recordo folcloricamente um facto que aconteceu há dois mil anos, mas quando espero sofregamente a Boa Notícia de me saber sempre querido e amado por Deus.

É Natal, não quando faço do meu Deus um ser todo-poderoso, nimbado de anjos e de milagres, mas quando descubro o seu rosto de criança indefesa, que desarma a minha fome de prestígio, de domínio e de força.

É Natal, não quando figuro um Deus impassível, longínquo, abstracto, mas quando sinto a meu lado, pelo caminho da vida - como os dois exilados de Emaús - um Deus vivo, que se fia e aposta em mim, ama, se compadece, cultiva o humor, faz festa e é bem mais humano do que eu próprio.

É Natal, não quando adoro um Menino Jesus açucarado, pobrezinho, que provoca pena e compaixão, mas quando pressinto um bebé perigoso, que põe em rebuliço Jerusalém inteira e seus chefes, gera interrogações e se faz procurar pelos pobres - pastores e Magos - que subverte, provoca e incomoda o meu comodismo e as minhas certezas.

É Natal, não quando inundo o meu Deus de presentes, de promessas e de boas obras, mas quando esqueço as prendas à boca do presépio e ali fico estupefacto, extasiado, maravilhado, com a ternura do Menino, que se fez e me ensina a ser mais simples, mais atento, mais sensível, mais acolhedor dos meus irmãos.

É Natal, não quando busco no cristianismo um meio de me afirmar, de me autojustificar e de discriminar os demais, mas quando saboreio o retrato do meu Deus, que não faz mal nem mete medo a ninguém e, por isso, nasceu num presépio e se deixou matar numa cruz.

É Natal, não quando me preocupo e vanglorio das coisas que faço por Deus e pelos outros, mas quando inventario e agradeço o amor e as maravilhas que Deus faz por mim cada dia.

É Natal, não quando remeto a conhecidos e amigos a costumeira avalancha de cartões de Boas-Festas, com mensagens impessoais e anódinas, mas quando distribuo pelos que estão a meu lado atenções contínuas, personalizadas e criativas.

É Natal, não quando concebo um Deus solteiro, feliz apenas consigo mesmo, mas quando acredito e vivo de um Deus-família, solidário e casado com a humanidade, que faz equipa, acompanha e se sente responsável diariamente pela minha fidelidade e felicidade.

P. Correia de Oliveira

domingo, 7 de dezembro de 2008

Um Conto de NATAL

Estamos a chegar à maravilhosa época de Natal e, por isso, sabe sempre bem recuperarmos estórias, bem nossas, e que por vezes, parecem que se perderam no tempo e no espaço. Esta foi recuperada e espero que nunca mais se perca, mesmo desconhecendo o seu autor. Quem quer que ele seja presto-lhe a minha homenagem, e com a sua autorização, vou partilhá-la com todos os que a quiserem ler.
Aníbal Carvalho

Um conto de Natal
Esta é uma história de Natal, diferente, mas igual a muitas outras histórias. E como todas as histórias, invariavelmente esta também começa com: 'era uma vez...'
Era uma vez um homem e uma mulher, ambos já de muita idade, que viviam numa pequena e modesta casinha isolada nas terras de Trás-os-Montes e Alto Douro. E ali viviam, desde que se tinham casado já lá iam cinquenta e quatro anos.
Os filhos entretanto cresceram, constituíram família e foram viver as suas vidas para a cidade, tendo ficado o casal a viver sozinho. As visitas dos filhos eram escassas e este ano tinha sido o primeiro em que nenhum dos dois filhos tinha feito nem uma visita aos “velhotes”. Embora não o dissessem, sentiam-se abandonados... mas, o Natal estava a chegar e como era tradição, as famílias reuniam-se em sua casa e passavam o período Natalício em conjunto. Já faltava pouco para que pudessem ver e abraçar filhos e netos!
Entretanto, a velha senhora cozinhava afincadamente dia após dia. Os seus olhos estavam mais vivos e os seus gestos mais lestos e cheios de alegria. A seu tempo as guloseimas e doces de Natal íam ficando prontas. As filhoses, o pão-de-ló, a aletria e os doces feitos a partir de receitas caseiras que só ela sabia fazer, mas que os netinhos adoravam. Ah... os queridos netinhos! Havia tanto tempo que não os via! Estas férias de Verão, e ao contrário do que era normal, não tinham vindo passar uns dias à aldeia. Mas isso agora não importava, porque não faltava muito e, eles viriam. Netos, filhos, e o resto da família. Aquela casa iria encher-se de novo de vida e alegria, com os gritinhos das crianças enquanto corriam pelo alpendre em gargalhadas histéricas e a lambuzar-se com os deliciosos docinhos feitas pela avozinha. As suas vozes acalmavam-se quando iam de encontro a ela e lhe segredavam ao ouvido: -"Sabes avó, gosto muito dos teus bolinhos... mas gosto ainda muito mais de ti!"
A avó, com o seu choro fácil, tentava sem conseguir disfarçar as lágrimas que surgiam. O marido, aparentemente abstraído de tudo, olhava ao longe. O seu ar duro suavizava--se perante aquele cenário de felicidade: a alegria daquelas crianças agarradas à avó. Sim, ele também era um homem feliz.
O filho mais novo vivia em Lisboa e a filha, em Coimbra. O casal não dizia nada mas sentia a falta dos seus. Estavam a perceber que a pouco e pouco estes se estavam a afastar, mas não ousavam dizer uma palavra, pois não queriam perturbar as vidas atarefadas dos seus filhos.
Nesta azáfama dos preparativos para o Natal, a velha senhora preparava-se para tirar uns docinhos deliciosos da fornalha caseira que ardia incessantemente quando o telefone tocou. O marido atendeu, deviam ser os filhos pra avisar quando chegariam. Ainda viriam provavelmente a tempo do almoço da véspera de Natal. Ele ouviu e não disse uma única palavra enquanto escutava o seu filho... este explicava-lhe que não iria ser possível ir lá acima. Um imprevisto profissional tinha acontecido e não seria possível passar o Natal lá em casa. Ao mesmo tempo, explicou-lhe que a sua irmã, ao saber disto, decidira também não ir, dado que sendo só ela, não valeria a pena ir! Afinal era uma viagem cansativa e complicada para os miúdos. Ele baixou o auscultador preto do seu velhíssimo telefone. O seu olhar triste foi pousar no olhar da sua esposa. Imediatamente ela percebeu. Não foi preciso dizer uma única palavra naquele momento. E não o disseram...
Sem desconfiarem, os filhos tinham destroçado os velhos corações dos seus pais e desta vez tinha sido a machadada final num ano muito difícil para ambos.Esquecidos e amargurados, ali ficaram. Ele ainda de pé, encostado à mesa, enquanto ela tinha já largado os doces e estava agora sentada numa cadeirinha de baloiço enquanto se cobria com uma coberta antiga que lhe protegia as pernas cansadas do frio, ao mesmo tempo que tentava esconder uma lágrima que lhe caía subitamente e rolava pela face. E assim, naquela noite adormeceram agarradinhos um ao outro, sentindo o calor da salamandra e tentando em vão aquecer os seus corações tristes.
Lá fora o frio caía na pequena aldeia, estava escuro e o vento soprava ferozmente... Ele levantou-se a meio da noite para fechar uma janela que batia furiosamente. O vento forte assobiava tenebrosamente na noite escura. Voltou para a cama e observou com um olhar sério e circunspecto a sua esposa que jazia com um olhar triste e vazio de esperança. Deitou-se lentamente e apagou a luz da gambiarra. E aquele dia assim findou...
De manhã, o dia acordou radioso, e apesar do frio que se fazia sentir, ele levantou-se cedo como era seu hábito e foi apanhar lenha pra alimentar a sua salamandra... A esposa, pelo contrário, ficou deitada. Não tinha vontade nem forças pra se levantar naquele dia. Ele entrou em casa, olhou-a prostrada naquela cama e, revoltado, pousou os ramos apanhados no bosque e dirigiu-se resoluto para o velho telefone.
Desta vez é que era. Estava decidido e ia fazer aquilo em que tinha pensado. A ideia amadurecera durante a noite mal passada. Esta vida triste tinha de acabar e ele estava resolvido a fazê-lo, dissessem o que dissessem, desta vez não iria estar com contemplações...
Pegou no telefone e ligou para o filho em Lisboa:
-"Filho... desculpa, eu não queria estar a incomodar-te, mas... eu tenho que te dar uma notícia. A tua mãe e eu... bem, nós... nós vamos separar-nos; 54 anos de sofrimento e infelicidade são pra mim mais que suficientes, e pra mim, chega! Estou farto...
-"Mas, pai... O que é que estás pr'aí a dizer? - gritou o filho.
Ele respondeu: -"Não conseguimos suportar-nos mais. Estamos fartos, e também já estamos fartos de discutir este assunto. Por isso telefona à tua irmã e dá-lhe tu a notícia." - e desligou o telefone.
Ela olhou com um ar de espanto o seu marido, pensando que talvez desta vez ele tivesse perdido o juízo por completo, enquanto este olhava pra cima e esboçava um sorriso de satisfação. Uma confiança súbita invadiu-lhe a alma com uma esperança renovada.
Histérico, o filho telefona à sua irmã de Coimbra que, ao saber da novidade, explode ao telefone. -"...o tanas é que eles se vão separar," - grita ela - "Eu vou já tratar disto."
Telefona logo de seguida pra casa dos pais. O telefone toca e quase de imediato o pai atende. Ele não tinha saído de perto como se adivinhasse que ele íria tocar daí a um instante: A filha, literalmente aos berros com o pai, diz:-"Vocês NÃO se VÃO divorciar. Tantos anos de casados, aturaram-se durante tanto tempo um ao outro, não é agora que vocês vão fazer uma coisa dessas. Não faz sentido! Não façam NADA enquanto eu não chegar aí. Eu vou ligar novamente para o meu irmão, e nós os dois vamos estar aí amanhã, sem falta. Até lá, não façam nada, OUVIRAM?" - e desligou o telefone.
O velho homem desligou também o telefone em seguida, e virando-se para a sua mulher deitada na cama, diz: -"Pronto, está tudo bem, minha querida. Eles vêm cá ter amanhã pra passar o dia de Natal connosco!"
Ela virou-se, olhou profundamente nos olhos do seu marido e percebendo a astuciosa artimanha que este tinha preparado aos filhos, abraçou-o. Uma outra lágrima voltou a escorrer na sua face, só que desta vez, a lágrima era de alegria. Iam passar o Natal com quem mais gostavam. Iam rever os seus filhos, os seus netinhos adoráveis e iam passar um inesperado, mas Feliz Natal... em família.

Autor desconhecido
(Adaptado)