quinta-feira, 24 de junho de 2010

Ser idoso e ser desprezado

Cada vez mais a nossa sociedade utiliza a técnica dos “descartáveis” que é, compra, usa e deita fora. Este processo também se aplica muitas vezes em relação às pessoas menos capazes ou até aquelas que sendo capazes são consideradas “velhas”.
A comprovar tudo isso vem este texto escrito com e alma e com coragem, por uma senhora idosa mas que revela a plenitude da sua vida.
É para promover o respeito e a dignidade dos mais velhos que coloco aqui o grito e o apelo desta senhora.
Esta senhora idosa morreu numa clínica da Escócia e todos pensavam que ela nada tinha deixado. No entanto, algumas enfermeiras encontraram junto dos seus poucos haveres um pequeno poema.
Este poema foi levado para a Irlanda e aí publicado na edição de Natal da notícia da União para a Saúde Mental na Irlanda do Norte.
Aníbal Carvalho


“Que vêem amigas? Que vêem ?
Que pensam quando me olham?
Uma velha rabugenta não muito inteligente
de hábitos incertos, com seus olhos sonhadores fixos ao longe?
A velha que cospe comida, que não responde
ao tentar ser convencida... “De, fazer um pequeno esforço?"
A velha, que vocês acreditam que não se dá conta
das coisas que vocês fazem e que continuamente
perde a sua escova ou o sapato ?
A velha, que contra sua vontade, mas humildemente lhes permite
a fazer o que queiram,que me banhem e me alimentem
só para o dia passar mais depressa....
É isso que vocês acham?É isso que vocês vêem?
Se assim for, abram os olhos, amigas, porque
isso que vocês vêem não sou eu!
Vou-lhes dizer quem sou, quando estou sentada aqui,
tão tranquila como me ordenaram...
Sou uma menina de 10 anos, que tem pai e mãe,
irmãos e irmãs que se amam.
Sou uma jovenzinha de 16 anos. Com asas nos pés,
e que sonha encontrar seu amado.
Sou uma noiva aos 20,
Que o coração salta nas lembranças,
Quando fiz a promessa
Que me uniu até o fim de meus dias com o AMOR de minha vida.
Sou ainda uma moça com 25 anos,
Que tem seus filhos,
Que precisam que eu os guie...
Tenho um lugar seguro e feliz !
Sou a mulher com 30 anos.
Onde os filhos crescem rápido,
E estamos unidos com laços que deveriam durar para sempre...
Quando tenho 40 anos
Meus filhos já cresceram
E não estão em casa...
Mas ao meu lado está meu marido
Que me acalenta quando estou triste.
Aos cinquenta, mais uma vez comigo deixam os bebés,
meus netos,e de novo tenho a alegria das crianças,
meus entes queridos junto a mim.
Aos 60 anos,
sobre mim nuvens escuras aparecem, meu marido está morto;
e quando olho o meu futuro arrepio-me toda de terror.
Os meus filhos foram-se, e agora têm os seus próprios filhos...
Então penso em tudo o que aconteceu e no amor que conheci.
Agora sou uma velha.
Que cruel é a natureza....
A velhice é uma piada
Que transforma um ser humano
Num alienado.
O corpo murcha
Os atractivos e a força desaparecem
Ali, onde uma vez houve um coração
Agora há uma pedra.

No entanto, nestas ruínas, a menina de 16 anos ainda está viva.
E o meu coração cansado, ainda está repleto de sentimentos
Vivos e conhecidos
Recordo os dias felizes e tristes
Nos meus pensamentos volto a amar e a viver o meu passado.
Penso em todos esses anos
Que foram, ao mesmo tempo poucos
Mas que passaram muito rápido,
E aceito o inevitável..
Que nada pode durar para sempre...por isso, abram os vossos olhos e vejam
Que diante de vocês não está uma velha mal-humorada.
Diante de vocês estou apenas “EU...”
Uma menina, mulher e senhora
Viva...!! E com todos os sentimentos de uma vida...
Lembrem-se deste poema da próxima vez que se encontrar com uma pessoa idosa mal-humorada e não a rejeitem,
Sem olhar primeiro a sua Alma Jovem…”

Mais tarde ou mais cedo qualquer um de nós também vai poder estar neste lugar, por isso não menospreze essa possibilidade.

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